quarta-feira, 11 de abril de 2007

As aventuras de Dom Antonio

Antônio Lars era um homem altamente compulsivo. Tinha sua rotina sagrada que incluía as atividades da manha, trabalho, jantar em casa entregue sempre pelo mesmo restaurante, e cama as nove em ponto. Seu único amigo era o porteiro Severino com quem falava todo dia por dois minutos. Ao marcar sua viagem o informou imediatamente para garantir que suas plantas seriam aguadas.
- Severino amanha vou viajar para Frankfurt com escala em Sao Paulo e Madrid.-
Com a cara de retardado que só o Severino sabia fazer e sem nenhuma ideia de onde ficava Frankfurt ele disse:
-Tabom Seu Antônio. É só deixar as chave que eu dou agua as plantas-
Na manha da viagem não quebrou nenhum de seus hábitos. Antônio acordou as cinco horas em ponto (em seu apartamento impecável) e ligou a maquina espanhola de café que já continha exatamente 4 gramas de café, enquanto tomava banho. Seu banho de exatamente quarto minutos lhe deixava um minuto para se secar enquanto o café ficava pronto. Saindo do banho numa linha continua ele pegava o café, abria a porta de casa para apanhar o jornal e se sentava em sua varanda. Cruzava a perna direita sobre a esquerda e lia o jornal ate exatamente as oito. Era um homem exato.
Depois de ajeitar tudo com Severino se despediu e saiu para o aeroporto pouco depois do meio dia. Sua viagem demorou pela observação de Antônio quarenta e dois minutos. Ao chegar nem notou a bagunça no aeroporto como tinha se acostumado a fazer para preservar sua sanidade. Com toda a calma e elegância que faltava no ambiente ele em seu terno azul, cabelo colado pra tras e carregando um guarda chuva como uma bengala andou até o balcão e disse simplesmente:
-Eu gostaria de fazer o check-in por favor para o vôo das seis saindo do Rio de Janeiro para Frankfurt com escala em Sao Paulo e Madrid. -
As atendentes do balcão, como o resto do aeroporto que não tiravam seus olhos do Antônio, se entreolharam por um segundo com um sorriso.
-Desculpa senhor mas não começamos a fazer check-in para este vôo ainda. Se o senhor quiser se sentar, devemos começar às quatro. -
O esforco de ficar parado no meio daquelas pessoas mal educadas jogadas pelo chão, foi todo desperdicado pois as quatro as cinco e as cinco e meia a resposta foi a mesma. “Só um pouquinho mais, senhor.” As cinco e quarenta e cinco ele voltou outra vez ja sem a calma e a tranquilidade que sempre carregava nos olhos.
-Madame, por favor, gostaria de fazer o check-in para o vôo das seis para Frankfurt com escala em Sao Paulo e Madrid. São cinco e quarenta e seis pelo seu relógio e vou perder meu vôo das seis. -
- Ninguém te falou não? Tá tudo atrasado. Você não vai perder nada! -
A gota de suor que apareceu na testa de Antônio ao ouvir estas palavras pareceu ser a ultima gota. Ele levantou o guarda chuva e começou a gritar,
-Vocês estão de brincadeira! Não sei como vocês podem fazer isto comigo! Isto é uma desgraça! Deviam estar envergonhados de trabalhar para esta companhia-
A atendente tentou explicar que não tinha nada haver com a companhia, que era devido ao apagão aéreo, mas a voz de Antônio não parou um segundo para ouvir-la. Logo uma platéia formou-se atras dele com seus gritos de protesto. Antônio continuou.
- Eu estou aqui há horas!-
- ?????-
- Vocês são umas idiotas com seus chapeuzinhos falando mais um pouquinho, mais um pouquinho…-
- ?????-
A situação ficou feia. Antônio tinha começado um protesto serio, e as atendentes do balcão não sabiam o que fazer. Não fossem os guardas que tinham se mobilizado para garantir a segurança nos aeroportos, teria dado guerra. Quando começaram a espancar o Antônio viram que o problema era maior que pensavam, pois um perfeccionista é como uma rocha só desiste morto. Antônio perdeu a briga mas a luta que ele fez usando o seu guarda chuva como uma espada contra s guardas foi épica. Quando finalmente arrastaram ele do salão do aeroporto os outros passageiros ouviram sua voz desaparecer…
- Eu tenho que embarcar no avião das seis para Frankfurt com escala em Sao…-
Varias brigas depois o soltaram no aeroporto. Antes de ir embora foi ao balcão da companhia aérea e lhes informou que nunca mais viajaria por aquela companhia.
Pelo menos não quebrou sua rotina. Às cinco horas do dia seguinte estava de pé e continuou como se nada tivesse acontecido. Saindo de casa encontrou o Severino na porta e explicou a situação dizendo:
- Já que não vou a Frankfurt você não precisa dar agua as plantas-
E Severino respondeu
- Porque que você não pega um ônibus, chefe?-

Pedro Widmar

terça-feira, 10 de abril de 2007

" O "

Recentemente assistí um programa sobre o desenvolvimento da fala. Desde então refleti muito sobre a vida do homem selvagem. Especificamente, imagino a cena dos homens pre-históricos que decidiram abandonar suas cavernas para a vida no campo. Imagino se deram qualquer importância à formulação das primeiras palavras que substituíram os ruídos com qual se comunicavam. E apesar das línguas do mundo terem evoluído com tanta complexidade que permitem que uma palavra como “independentemente” seja formada, alguns ruídos perseveraram até hoje. E alguns desses ruídos pequenininhos quase minúsculos incitam efeitos de proporções gigantescas. Tal é o caso do “ó” que destruiu a harmonia na minha família.
O “ó”, um ruido que potencialmente serviu para conseguir a atenção de uns ou expressar alegria de outros, ainda hoje pode servir para muitas coisas. O comando “olha ali”, ou “preste atenção” etc. Mas quando minha vó o usou uma noite durante o jantar a intenção não foi nada tão pacifico.
Tudo começou num jantar onde meu avo tinha convidado seu melhor amigo Ernesto para jantar conosco. Enquanto jantava ele conversava com Ernesto sobre sua família e o orgulho que tinha de seu trabalho por eles. Mas minha vó que tinha que ser o centro das atenções sempre, nao permitiu seu display de orgulho.
- Ernesto, posso te dizer que o maior prazer que tenho nesta vida são meus filhos e netos.- Ele nos introduziu por nome como costumava fazer.
- Otávio (meu avô) você tem uma família linda. E que netos preciosos. Você realmente merece.
- Eu não contestarei isso. É verdade. Trabalhei tanto, e me dediquei tanto para eles que acredito que mereço agora ver eles todos crescerem em paz.
-Ó- soltou minha vó do outro lado da mesa. Como se tivesse escapado mas de proposito.
- O que foi Gilda?- perguntou meu avô, com sua cara ficando vermelha.
- Até parece que você deu duro. Eu que alimentei, criei, lavei roupa, cozinhei, você não fez nada. -
Este tipo de argumento da minha vó era comum apesar dela ter baba, cozinheira, empregada e todos os luxos disponíveis para uma família ela sempre menosprezava o trabalho dele. E ele sempre caia no argumento, por isso todos nos ficamos espantados quando a cara dele caiu. Mas nenhum de nos ficou tão chocado quanto minha vó, quando ele virou e disse
- Ah Gilda, vai a merda! Já que você é tao guerreira pode ficar com esta vida.-
Quando ele saiu pela porta foi a ultima vez que o vimos. Naquela época não entendi muito bem o que tinha acontecido mas pela cara do senhor Ernesto que estava congelado com uma colher de sopa suspendida no ar enfrente a sua boca, eu sabia que nao era nada bom. E hoje após muita consideração vim a conclusão que foi aquele pequeno “ó” que quebrou as costas do camelo, como dizem.
Ó. Uma palavra tao pequena com efeito tão poderoso. Quem não viveu um momento desses nao deve nem acreditar. E é difícil mesmo ver como as vezes o menor barulho ou ate um olhar pode entregar um bofetão tão grande. Penso nestas coisas esquisitas com frequência. E enquanto penso nisso tenho que duvidar se nao foi um próprio “ó” que fez o homem sair andando da caverna.

Uma por Uma

Depois de meses longe de casa finalmente voltei ao interior para uma festa de aniversario num terreno em Secretario. Logo apos as primeiras cervejas e um comentário passivo sobre a beleza do terreno, começou um debate inflamado sobre o meio ambiente. Um lado defendia a dependencia do mundo em matérias primas enquanto o outro indignado fazia exclamações sobre a necessidade de preservar ou reverter os efeitos nocivos do homem no planeta. Eu como sempre fiquei mais como espectador do que participante. O General, anfitrião da festa, ficou igualmente calado, mas quando finalmente falou foi para encerrar com estilo. Com simples palavras ele desembrulhou “Um homem que nunca plantou uma arvore, é um ser humano incompleto.”
A expressão “caiu a ficha” nunca descreveu tão bem uma situação. Todos calados, introspectivos. Eu olhando o general e o General olhando seus filhos, netos e bisnetos. De repente ele se levantou e disse firmemente “Com licença, mas agora vou deitar.” Depois de ele partir da mesa os convidados continuaram a conversar sobre vários aspectos mais eu não pude continuar na mesa. Tinha me caído um raio na cabeça. As palavras do general não poderiam estar mais certas. Se cada um plantasse uma arvore, pensei, como o mundo melhoraria! É o que nos falta para completar o circulo da corrente de nossa existência. Retribuir algo ao planeta por seus vários presentes. Eu estava determinado. Aquela semana plantaria uma arvore.
De volta na cidade me informei sobre a loja de um português que teria mudas de arvores exóticas. Confesso não entender muito destas coisas mais eu não aceitaria uma arvore qualquer. Eu queria que a minha fosse especial.
Entrando na loja meio tarde e com toda a paixão que se precisa para invadir um continente vi um senhor emaciado nos fundos de cara para a parede, sem duvida trabalhando.
- Boa noite. Quero uma arvore.-
Devo ter falado alto, pois o senhor levantou suas mãos e virou pra mim bem devagar.
- Aqui não tem dinheiro meu filho.
Eu envergonhado tentei acalmar-lo mas cada palavra que eu dizia parecia espantar-lo mais. Ele começou a chorar. Não sabia o que fazer. Decidi sair correndo.
Dias depois e vários metros de desvio para não passar em frente à loja do pobre senhor a quem eu fiz chorar, encontrei finalmente uma muda de arvore qualquer e a comprei. E agora. Onde plantaria aquela muda? Não tenho terra, nem sitio. Fiquei olhando aquela muda quase meia hora antes de resolver o problema. Eu esperaria o meio da noite, e em algum lugar, alguma praça eu plantaria minha arvore, Tereza. Eu tinha que plantar esta arvore. Desde a hora que o general tinha dito aquelas palavras sentia um vazio que nunca tinha sentido antes. E apesar disto o meio ambiente precisava de arvores para normalizar. Todos ganhavam.
Tinha me equipado todo para escalar a grade da praça Nossa Senhora da Paz. Ali plantaria minha homenagem à natureza. Quando o alarme tocou a meia noite sai de casa com minhas roupas mais usadas. Depois de quatro voltas na praça para evitar flanelinhas consegui finalmente encontrar um ponto na grade onde mendigos tinham quebrado as espadas de cima para entrar com facilidade. Facilidade relativa pois me quebrei todo para conseguir passar para dentro mais minha arvore resistiu à tentativa. Estava quase lá. Ultrapassando os patos e me enfiando numa parte bem escondida dos arbustos comecei a cavar. O cheiro das pessoas dormindo a meu lado não me faria desistir hoje. Hoje eu era um homem com uma missão. Estava quase terminando de cavar quando a luz bateu na minha cara.
- Que tu ta fazendo ai?-
Congelei.
- Ei vem aqui seu vagabundo.-
Achei o termo meio severo, mas só então notei que estava vestido como um vagabundo mesmo e tentei explicar.
- É confusão senhor. Eu só estava…-
O primeiro policial virou para o segundo e disse.
- Esse ai tem cara daquele suspeito de assalto, tem não?-
- Eu? -
- Encaixa perfeitamente –
Os dois botaram as mãos nas armas e me disseram para colocar minhas no ar. Ali eu estava, no meio de mendigos, coberto em lama, vestido como um vagabundo sendo preso. Levantei minhas mãos segurando minha arvore e segui suas instruções para os encontrar no portão. Dali fui à delegacia para explicar tudo e finalmente apos provar que não sou nem assaltante nem mendigo consegui voltar para a segurança de meu sofá.
No próximo fim de semana voltei ao sitio do general que mal me reconheceu mas garanto que nunca mais me esqueceu pois entreguei-lhe a muda nas mãos e claramente escolhendo meu lado no debate disse,
“Sabe de uma coisa, salvar o mundo é muito caro pra mim.”

Alo! Alo! (Introducao)

Este blog vai ser somente para expor ideias em forma de cronicas. Espero que voces chorem , riem , e copiem a vontade... mas sempre com meu nome em baixo... ahhahha
Se quiserem postar suas cronicas aqui me mande por email que eu coloco na parte de outros escritores, ou se quiserem debater minhas podem postar em baixo mesmo...

TODAS AS CRONICAS ESTAO AQUI DO LADO LISTADAS POR NOME, TEM MUITO MAIS DO DOM ANTONIO MAS PRECISO CORRIGI-LAS ANTES DE POSTAR....
Vlw
Pedro

 
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