sábado, 19 de maio de 2007

Onde encontrar Justiça

Apos semanas de conversa com seu porteiro novo Zé, João Almeida decidiu se mudar para a favela. Largou seu jornal de sábado na mesa de seu escritório de cinqüenta metros quadrados, pegou seu troféu de golfe amador no Itanhanga, e partiu. Ao passar por suas secretarias falou – to saindo – e desceu para a garagem. Foi correndo pra casa em seu BMW Z5 e falou para sua mulher pegar algumas coisas e se despedir da cobertura na Viera Souto.
- Mulher, hoje nos vamos nos mudar.
A mulher de João, Luisa, olhou para a cara do marido.
- E tem mais, esquece suas coisas aqui.
- Você esta maluco João? Como assim se mudar?
-Maluco? Estava! Não estou mais. Me recuso a viver esta vida indigna. Eu falei com o Zé e ele vai trocar de casa conosco.
- O que??? Você esta maluco João! Ai meu deus, Zé quem? O porteiro?...
Luisa começou a chorar e se trancou dentro do banheiro, mas João pela porta continuou a falar.
- Luisa. Todo dia eu acordo cedo e dirijo meu caro ate o trabalho pensando o tempo inteiro ‘será que hoje vão roubar meu caro, ou me raptar’ depois eu chego ao escritório cheio de preocupação sobre o desempenho da empresa. Depois almoço corrido ao mesmo tempo ligando para casa para ver se vocês estão bem. Depois volto pra casa em engarrafamento extremo o tempo inteiro com minhas preocupações me matando. Tenho ulceras de tanto me preocupar. Enquanto isso o governo mete a mão no meu bolso, pior eu abro meu bolso obrigatoriamente, para financiar deus sabe o que. Chego em casa no final do dia para encontrar contas e ao colocar a chave na porta sempre me preparo para a pior das possibilidades. Não agüento mais! Eu estou cansado de ser um babaca me matando para doar dinheiro abertamente às coisas que não funcionam.
Luisa abriu a porta e disse;
- Calma João você esta falando rápido e eu estou ficando com medo.
- Não tenha medo mulher. Simplesmente faca uma mala.
A mulher de João ficou imóvel sentada na cama.
- Mas e nossas coisas? Nossos confortos.
- Ahhh...não se preocupe meu amor. Confie em mim como sempre confiou.
Luisa se levantou e começou a fazer uma mala. Enquanto isso João ligara para seu porteiro pelo interfone.
- Zé... estamos prontos...é isso mesmo... ta bom entoa vou precisar das chaves.
Com isso a família se direcionou à prudente de Moraes e pegou uma van para sua nova casa. As meninas tiveram o maior choque, e Luisa que não cozinhava a anos demorou para dominar o fogão novamente mas João estava em casa. Todo dia acordava lá pro meio dia e sem camisa andava ate a banca de jornal onde teria trocado o globo por o Dia. Em casa dava um tapa na bunda de Luisa enquanto ela preparava o café da manha e se espreguiçava todo no canto do salão que estava designado cozinha. Suas ulceras tinham desaparecido e na primeira semana ganhou o sorteio dos traficantes. O premio, uma geladeira. De tarde descia para o boteco onde ficava contando historias a tarde inteira. Seus vizinhos o achavam maluco de inventar historias de vôos internacionais e reuniões com o presidente da republica. Mas João não se importava. Não pagava mais impostos. Tinha o pacote gato completo e suas filhas com certeza entrariam para uma faculdade publica pelo sistema de cotas. A noite chegava em casa para jantar e logo em seguida assistia a novela com a família inteira.
Problemas? Claro que existiam negativos na situação como tiroteios e invasões de outras facções mais pelo menos lá encima João recebia a qualidade de segurança para que pagava. Zero por Zero pelo menos é justo. Ele não considerava por um sequer segundo voltar àquela vida dele. Lá embaixo ele se estressava, não tinha a quem pedir ajuda e pior pagava para se aborrecer. Aqui não. A vida era finalmente bela. Inclusive a única preocupação de João era como continuar evitando o Zé que queria desesperadamente sua vida de volta.

segunda-feira, 14 de maio de 2007

As perolas da Experiencia

!!!!!!!!!!!temporariamente sobre revisao!!!!!!!!!

quinta-feira, 10 de maio de 2007

Dona Hilda e o Jogo

Ao encontrar as portas do bingo arpoador fechadas, Hilda respirou em derrota. Apos anos de vida tinha aprendido a viver com perda. Perdeu o marido, a juventude, a vista, os ouvidos e mais recentemente o gato. Inclusive estava ficando esclerosada como teria notado. A única coisa que restava à senhora eram o Bingo e as taças de vinho com o jantar. Pelo menos ate então. O que faria agora? Oitenta e dois anos eram demais para aprender um novo esporte. Academia, ha! Nem morta. Ate que a idéia finalmente surgiu em sua cabeça- Pois o jogador é um atleta persistente- de jogar nos caca níqueis.
Como faria isso? Durante os próximos dias a vergonha de entrar num boteco foi desaparecendo. Ao olhar o boteco em frente de sua casa tentou varias vezes entrar mas sempre passava uma das senhoras da igreja e viam ela. Depois de horas de falar abobrinha decidiu pegar um táxi para a zona norte onde não seria flagrada.
Chegando no boteco o taxista perguntou se era aquele lugar mesmo, pois Dona Hilda estava vestida como qualquer senhora de um certo nível da zona sul, ate de chapéu. Entrou no boteco e viu que a maquina só aceitava notas de um real. Dona Hilda só tinha de Cem. Com demasiada educação para o local pediu troco ao ‘barman’ e lá se foi.
Teria sido uma salvação para ela não fosse a operação da PM que atingia especificamente aquele boteco. A velha olhando mal via as figuras entrando no boteco, mas conseguiu ver as armas que carregavam.
- Valha me Deus!
Saiu correndo mas tropeçou e caiu desmaiada em frente as maquinas. As moedas e notas foram se espalhando pra lá e pra cá.
Os dois detetives comandando a operação olharam pra ela e um disse pro outro;
- Que coisa triste, uma velhinha aqui dentro.
- Triste? Quem você acha que esta velhinha é ? Pois eu te digo. Vestida assim, com todo este troco nas mãos, e tentou correr... é a própria Bicheira!
Quando finalmente acordou dona Hilda estava numa cela de batalhão deitada no chão. Se levantou com nojo, e pensou – Ih! Puta merda, agora você consegui Hilda acordou numa cadeia.- Desorientada e sem idéia de como tinha chegado lá, simplesmente se ajeitou no espelhinho e sentou com as pernas cruzadas esperando alguém vir. Os detetives no outro lado do espelho de interrogação comentavam;
- Olha a frieza dela. Esta vai ser difícil de quebrar. Não fala nunca.
- Porque você diz isto?
- Viu como acordou parecendo que nem se importava com a prisão. Simplesmente ajeitou o cabelo e senta ai como uma pedra.
- Quando vamos falar com ela?
- Esperaremos um pouco, vamos deixar ela começar a suar. Deixemos que ela precise de algo assim podemos ter uma vantagem quando conversando.
Dentro da cela as horas passavam e Dona Hilda ficava imóvel, ate dormindo as vezes sentada como tinha aprendido a fazer com os anos. Os detetives por outra mão estavam apertados para ir ao banheiro, com fome e sede e não agüentavam mais. Entraram já enfuriados na sala.
- Então você acha que jogo não é um problema?
Hilda acordou abruptamente e meio bêbada do sono respondeu
- Não tem nada errado com o jogo. O único problema são aqueles burocratas idiotas fechando os Bingos.
- Ah então você defende os bingos também, Você tem parte neles?
- Meu filho eu tenho parte neles sempre que posso.
- Qual deles?
- o do Arpoador.
- Eu sabia. Sabia que você não era uma qualquer.
Dona Hilda se ofendeu. Apesar de não ter idéia nenhuma de quem ele era e onde estava ou do que estava se falando defendeu seu caráter com uma lagrima no olho;
- Eu não sou uma qualquer não. Eu tive uma vida muito ativa. Criei, lutei, e consegui ser sucedida. Tive dificuldades. Todos nos tivemos. Mas hoje sou orgulhosa de ter vencido os maiores obstáculos.
Na outra sala de novo os detetives se davam parabéns. Tinham pego uma grande chefe de quadrilha admitida. Era promoção para todos. Arranjaram as burocracias e logo a senhora estava no tribunal. Lá apos vexames, rebaixamentos e ate demissões, Dona Hilda voltara a sua casa onde apos alguns dias nem se lembrava mais do ocorrido.
Se levantou normalmente apos o almoço, botou comida para um gato que não existia mais e prosseguiu ao bingo arpoador onde não ao maior espanto, entrou e jogou a tarde inteira.

quarta-feira, 2 de maio de 2007

MInhas conchas de crianca

Este sábado decidi ir à praia procurar conchas. A muito tempo não faço isso. Quando eu era criança costumava catar conchas na beira do mar e trazer-las para minha mãe. Ela brincava que se eu não parasse de catar tanto elas iriam acabar. Eu ria e continuava. Era a maneira dela controlar a quantidade de conchas que teria que carregar pra casa. Mas para mim as conchas eram inaliáveis. Ao crescer continuei procurando conchas, mas somente pro meu bolso. É esquisito. Isso eu sei, mas algo me faz pegar elas, e alem do mais é algo a fazer na praia.
Ao chegar na praia a água estava prístina. Sentei em minha cadeira um pouco e pedi um mate antes de iniciar minha caça. Olhei e olhei mas este ano não encontrei mais de uma meia dúzia antes de desistir. De volta em minha cadeira comecei a pensar na minha maior aventura.
Desde criança sempre quis ser um pescador. Aos quatorze anos assistindo um destes reality-shows, vi que na Alaska um homem pode trabalhar como pescador de caranguejo sem nenhuma experiência. Que sonho bom. Imaginava o primeiro dia abordo um barco daqueles nos mares gelados do norte do mundo. Pelo programa fui informado que os pescadores trabalhavam no barco por as vezes cento e oitenta dias. Enquanto imaginava a vida no mar podia quase sentir o gosto da água salgada nos meus lábios. Não demorei muito para me inscrever.
Depois de pouca pesquisa e dezoito anos de vida só levou uma semana para encontrar uma embarcação que me contrataria. Marquei com o capitão de nos encontrar numa dinner americana em Anchorage, Alaska. Aquela tarde o capitão do ‘Forrester’, navio em qual satisfaria minha curiosidade por uma vida cheia de mistério e aventura, me explicou como as coisas funcionariam. No final de nossa conversa ele me avisou que não sabia quanto tempo a temporada duraria aquele ano dizendo que os efeitos do aquecimento global tinham alterado as áreas de pesca e estava muito difícil encontrar caranguejos. Me lembrei de sites em que tinha lido sobre os grandes pescadores do século dezenove que perambulavam os mares por as vezes ate quatro anos. Mas não me espantei. Eu ia com os ventos naquela época.
Inclusive só fiquei espantado quando nossa temporada acabou depois de três dias. Perguntei a todos o que tinha acontecido, mas ninguém sabia. Fui descobrir depois que de acordo com as leis do sindicato dos pescadores, se não tivesse uma quantidade especifica de caranguejos por dia nos barcos a temporada acabava. Ninguém achou caranguejos. O capitão de meu barco berrava palavrões e quebrava seu gabinete enquanto eu como o resto ficava em silencio. Ao voltar pra casa infeliz e cansado decidi pesquisar os fatos.
O mundo como muda. A menos de cem anos atrás as embarcações de caranguejo ficavam meses no mar voltando cheias. Agora, três dias e já desistem. O mar estava cheio de peixe antigamente. Pode ser falta de sorte. Pode ser uma alteração real causada pelo aquecimento global. Eu não sei o que mudou pois não sou cientista. Mas algo, sim, mudou.
Hoje enquanto sento na minha areia de Ipanema, olhando o azul e verde penso só em minhas conchinhas amarelas. Fico pensando pra onde elas foram como os caranguejos que derrubaram meu sonho. Penso nos danos que as vezes fazemos sem saber. Mas no final do dia tomo meu mate e sorrio um pouco pensando , mamãe estava certa; elas acabaram.

 
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