terça-feira, 10 de abril de 2007

Uma por Uma

Depois de meses longe de casa finalmente voltei ao interior para uma festa de aniversario num terreno em Secretario. Logo apos as primeiras cervejas e um comentário passivo sobre a beleza do terreno, começou um debate inflamado sobre o meio ambiente. Um lado defendia a dependencia do mundo em matérias primas enquanto o outro indignado fazia exclamações sobre a necessidade de preservar ou reverter os efeitos nocivos do homem no planeta. Eu como sempre fiquei mais como espectador do que participante. O General, anfitrião da festa, ficou igualmente calado, mas quando finalmente falou foi para encerrar com estilo. Com simples palavras ele desembrulhou “Um homem que nunca plantou uma arvore, é um ser humano incompleto.”
A expressão “caiu a ficha” nunca descreveu tão bem uma situação. Todos calados, introspectivos. Eu olhando o general e o General olhando seus filhos, netos e bisnetos. De repente ele se levantou e disse firmemente “Com licença, mas agora vou deitar.” Depois de ele partir da mesa os convidados continuaram a conversar sobre vários aspectos mais eu não pude continuar na mesa. Tinha me caído um raio na cabeça. As palavras do general não poderiam estar mais certas. Se cada um plantasse uma arvore, pensei, como o mundo melhoraria! É o que nos falta para completar o circulo da corrente de nossa existência. Retribuir algo ao planeta por seus vários presentes. Eu estava determinado. Aquela semana plantaria uma arvore.
De volta na cidade me informei sobre a loja de um português que teria mudas de arvores exóticas. Confesso não entender muito destas coisas mais eu não aceitaria uma arvore qualquer. Eu queria que a minha fosse especial.
Entrando na loja meio tarde e com toda a paixão que se precisa para invadir um continente vi um senhor emaciado nos fundos de cara para a parede, sem duvida trabalhando.
- Boa noite. Quero uma arvore.-
Devo ter falado alto, pois o senhor levantou suas mãos e virou pra mim bem devagar.
- Aqui não tem dinheiro meu filho.
Eu envergonhado tentei acalmar-lo mas cada palavra que eu dizia parecia espantar-lo mais. Ele começou a chorar. Não sabia o que fazer. Decidi sair correndo.
Dias depois e vários metros de desvio para não passar em frente à loja do pobre senhor a quem eu fiz chorar, encontrei finalmente uma muda de arvore qualquer e a comprei. E agora. Onde plantaria aquela muda? Não tenho terra, nem sitio. Fiquei olhando aquela muda quase meia hora antes de resolver o problema. Eu esperaria o meio da noite, e em algum lugar, alguma praça eu plantaria minha arvore, Tereza. Eu tinha que plantar esta arvore. Desde a hora que o general tinha dito aquelas palavras sentia um vazio que nunca tinha sentido antes. E apesar disto o meio ambiente precisava de arvores para normalizar. Todos ganhavam.
Tinha me equipado todo para escalar a grade da praça Nossa Senhora da Paz. Ali plantaria minha homenagem à natureza. Quando o alarme tocou a meia noite sai de casa com minhas roupas mais usadas. Depois de quatro voltas na praça para evitar flanelinhas consegui finalmente encontrar um ponto na grade onde mendigos tinham quebrado as espadas de cima para entrar com facilidade. Facilidade relativa pois me quebrei todo para conseguir passar para dentro mais minha arvore resistiu à tentativa. Estava quase lá. Ultrapassando os patos e me enfiando numa parte bem escondida dos arbustos comecei a cavar. O cheiro das pessoas dormindo a meu lado não me faria desistir hoje. Hoje eu era um homem com uma missão. Estava quase terminando de cavar quando a luz bateu na minha cara.
- Que tu ta fazendo ai?-
Congelei.
- Ei vem aqui seu vagabundo.-
Achei o termo meio severo, mas só então notei que estava vestido como um vagabundo mesmo e tentei explicar.
- É confusão senhor. Eu só estava…-
O primeiro policial virou para o segundo e disse.
- Esse ai tem cara daquele suspeito de assalto, tem não?-
- Eu? -
- Encaixa perfeitamente –
Os dois botaram as mãos nas armas e me disseram para colocar minhas no ar. Ali eu estava, no meio de mendigos, coberto em lama, vestido como um vagabundo sendo preso. Levantei minhas mãos segurando minha arvore e segui suas instruções para os encontrar no portão. Dali fui à delegacia para explicar tudo e finalmente apos provar que não sou nem assaltante nem mendigo consegui voltar para a segurança de meu sofá.
No próximo fim de semana voltei ao sitio do general que mal me reconheceu mas garanto que nunca mais me esqueceu pois entreguei-lhe a muda nas mãos e claramente escolhendo meu lado no debate disse,
“Sabe de uma coisa, salvar o mundo é muito caro pra mim.”

Um comentário:

Beatriz disse...

Seus desfechos são sempre perfeitos.

Adorei esse parágrafo:
Entrando na loja meio tarde e com toda a paixão que se precisa para invadir um continente vi um senhor emaciado nos fundos de cara para a parede, sem duvida trabalhando.
- Boa noite. Quero uma arvore.-

 
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