domingo, 22 de junho de 2008

Cidade Desfocada

     Essa semana a cidade ferveu com indignação diante da atitude dos militares que entregaram três meninos nas mãos de traficantes rivais. A atitude destes poucos homens foi tão significante ao país, aparentemente, que até o Ministro da Defesa veio ao Rio de Janeiro pedir desculpas pessoalmente às famílias das vitimas. Sinto pelas mães, pais e irmãos destes três. Mas o que me horroriza é o que leio sobre o caso. O medo que sinto é pelo resto de nós.
     Ao ler nos jornais frases tão impactantes como “o que o exercito fez foi matar os garotos” fiquei pasmo. A impressão é de que a cidade condena a ação dos militares, enquanto isenta os traficantes. Parece que o trafico é uma existência inquestionável, uma instituição brasileira. Mas ao pesquisar e ler algumas das opiniões pela internet, se vê uma linha negra no chão que divide a opinião publica. Indignação? Sim, mas dos dois lados. Enquanto a população dos morros protesta e conclama a saída do exercito, no asfalto a musica é diferente.
     Ao olhar as opiniões em sites como o Globo Online (oglobo.globo.com para quem esteve em coma durantes os últimos anos), a indignação do público é justamente com a falta de ação militar em seus bairros. “Bota os militares aqui no Leme” grita um internauta. “Se eles não ficarem na Providência, manda para a Tijuca que agradeceremos” registrou outro.
     O carioca da Zona Sul não entende como a morte de três rapazes ligados ao trafico pode ser algo nefasto. Tenho que admitir que também não entendo como com tantas pessoas inocentes sendo assassinadas no Rio de Janeiro diariamente a morte de três traficantes, ou envolvidos, possa ser questão para primeira pagina de jornal. Pelo menos no sentido negativo.
     A frieza com que trato o assunto não é a reflexão de uma alma endurecida. Nem é a vontade mavórtica de um “Anti-Favelista”. Existe, pela primeira vez desde que eu voltei a viver no Rio de Janeiro, uma manifestação pública de confronto de opinião. E até onde isto irá é uma questão de saber se o governo vai se dar conta que este assunto esta dividindo a cidade. Mas a realidade brutal é que numa cidade onde a notícia é que o exercito agiu incorretamente, e não que o trafico assassinou três pessoas, estamos realmente fora de foco.

domingo, 15 de junho de 2008

Palhaçada? Vai se acostumando...


         Se todos nós falamos o mesmo idioma aqui no Rio, fora os argentinos vendendo colares e pulseiras no arpoador, então por que não existe um diálogo maior entre as classes? Infelizmente, nossa sociedade é segregada em tudo, até em ônibus, onde 50 centavos pode ser a diferença entre até três classes econômicas.
        Me ocorre então que talvez a questão de língua não se define somente por idioma, e sim por uma equação de IDIOMA+CONTEÚDO. Sendo que o conteúdo, talvez, pese mais.
        As sociedades se dividem, irrelevante das políticas de inclusão, e sempre se dividirão. Não importa o que você fala; seja inglês, francês, ou árabe, o que realmente importa é SOBRE o que você fala... como se a divisão entre os tipos de linguagem ( Culta, Informal, e Vulgar) pudesse ser aplicada a conteúdo.
        No caso, existiria um conteúdo culto ( Wagner, Bauman, Costa-Gavras), um informal (Madonna, Kellner, Spielberg ), e um Vulgar (Mc Sapão, Paulo Coelho, Jim Jarmusch).
        Para explorar esta teoria, diga-se que três homens estão naufragados em uma ilha deserta. O primeiro, chamaremos de Helmut um banqueiro alemão de conteúdo culto. O segundo um sociólogo japonês Akira, também de conteúdo culto. E um terceiro, Wanderleison, um caminhoneiro nordestino cujo conteúdo seja vulgar (Se a realidade parece racismo, estamos mal). O que acontecerá?
        Acho que é realístico supor que Helmut e Akira por terem uma cultura semelhante formarão laços inalcançáveis a Wanderleison. Não que ele seria abandonado, mas o seu cânon, e por isso seu conhecimento cultural, o limitaria em muitas conversas. Formando uma barreira cultural. Talvez um exemplo fraco, mas se você entendeu, não canse minha beleza. (como diz minha bisavó)
        É triste essa realidade, até porque Wanderleison deve contar as melhores piadas entre os três, e possivelmente é o mais divertido. Mas as realidades não deixam de ser verdade só por serem desagradáveis, como acreditam grande parte de nossos políticos. 

        Mas por que todo este discurso? Porque se realmente as linhas da segregação de nossa sociedade se baseiam em barreiras culturais, ou conhecimento, então existe uma solução simples para esta segregação: a educação. Se Helmut, Akira, e Wanderleison fossem igualmente educados, eles teriam uma plataforma para discussão ou seja uma base para a integração.
      As notas divulgadas esta semana para nosso sistema de ensino foram um vexame internacional. E para provar novamente a habilidade de nossos políticos, o Ministro da Educação conseguiu sem vergonha na cara expressar felicidade porque aparentemente superamos as metas do MEC para este ano. Mil desculpas por o que vou dizer agora, mas, puta merda! Se esses resultados superam a meta, então talvez o Brasil esteja realmente perdido como dizem por aí. Será que alguém colocou Whiskey no meu café? Será que o jornal em que li esta matéria virou um diário de comédia sem que eu soubesse?
      Quando superamos nossas metas e a melhor nota média do país é um 5, para mim a política de educação está não só falida mas incentivando a ignorância.

domingo, 8 de junho de 2008

Importado com o Exportado


            Vou avisando logo que após esta crônica posso acabar sendo obrigado a entrar em exílio, assim retardando a publicação da próxima crônica. Pêsames. Sei que para alguns não será um grande incômodo, mas espero, como qualquer escritor, que este grupo não seja muito grande.
           Esta semana tem sido repleta de conversas sobre o OMC e a proteção dos alimentos para que o mundo não sofra. Mas no meio de vários discursos eloqüentes dos lideres mundiais, lembrei de uma frase cujo autor me escapa, que sempre surge na minha cabeça cínica quando se trata de economia global: Não existe comunidade global.
           Explicarei para não soar ingênuo. O que a frase questiona é a vontade de governos individuais de fazerem o melhor para o mundo inteiro. No Brasil nem sei se passa por cinismo perguntar se os governos são realmente movimentados por vontades tão nobres no dia-a-dia das maquinas nacionais?
          A verdade é que cada governo joga por si mesmo(e as vezes até por seus cidadãos). Esperando agradar os moradores dos países que representam(alguns mais que outros) com suas atitudes. O que torna uma reunião para decidir como o mundo vai lidar com a falta de alimentos, em nada mais que uma convenção onde o real interesse é “Como que eu vou proteger o meu”. Se não fosse, a reunião duraria meia hora. Primeiro se olharia quanto o mundo produz de cada coisa, depois quanto cada um consume. Uma vez feito, começariam as distribuições proporcionais a preços iguais para todos, sem subsídios ou taxas de importação malucas. Mas o que acaba acontecendo é que todos querem lucrar, e os interesses das empresas falam mais alto que as do consumidor. No final acaba sendo o velho jogo capitalista: Winners and Losers.
          Foi então que me surgiu uma pergunta que não consegui responder. Por que, então, precisamos da comunidade Internacional? Calma não estou dizendo que não deveríamos trocar e aceitar mercadorias estrangeiras como o Iphone (estou doido pra comprar). Mas o Brasil como quinto maior pais do mundo tem solo suficiente para produzir tudo que precisamos aqui dentro. E por acaso tem também um numero suficiente de desempregados, ou empregados em atividades ilícitas que se aproveitados de forma legal, seriam uma força de trabalho gigantesca. Quem sabe podíamos até montar nossas próprias industrias, incluindo as de telefones celulares brilhantes.
           Mas e os salários? Quem vai trabalhar em agronegocio ou em alguma fabrica por um salário mínimo, quando pode ganhar um dinheirão no trafico do Rio? Bom, se o que sobra da arrecadação de impostos fosse usado para incentivar empresas que atuam no solo nacional invés das que funcionam fora do pais (como faz o BNDES que acaba de receber um aumento de 12,5 bilhões de nosso generoso Senado) resolveríamos a questão do salário mínimo em algumas semanas. Claro, não estou sugerindo que nossos impostos sejam usados para motivar a industria nacional e criar empregos. Isto seria um absurdo.(Aviso: Sarcasmo é a forma mais baixa de humor)
          Não entendo como um pais como o nosso pode estar olhando pra fora quando o cenário interno esta tão ruim. Afinal, quando eu pago impostos quero que estes sejam aplicados na manutenção dos espaços públicos, na proteção dos cidadãos, no prover de água e alimentos, e para financiar as instituições publicas, (Administração, Saúde, Justiça). Prefiro deixar para investir meu dinheiro no metro de Caracas (isso mesmo, na Venezuela), como faz nosso sagrado BNDES, quando tudo aqui estiver funcionando. Aí, sim, podemos conversar.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

A real "Inflação"

Pô se eu pegar este dinheiro da bolsa da mamãe ela nem vai se dar conta. E também é tão pouquinho, que nem faz diferença. Se eu pedir ela vai dizer que não e eu quero tanto comprar aquela bola de futebol, que não faz sentido ficar sem- o menino pensou enquanto deslizava os dedos entre as dobras da carteira.

Ah não tem problema colar na prova. Afinal ta todo mundo fazendo e se eu tirar uma nota baixa meus pais vão ficar chateados, ai vai ter conseqüência. Se for pra vir ate aqui todo dia e ficar reprovado só porque não gosto de estudar, não venho mais. É só sentar perto daquela menina com os óculos que sempre presta atenção e anota tudo que no meio da prova eu falo com ela pra liberar- o moleque planejou enquanto escovava os dentes.

Então o esquema é o seguinte, nos vamos vender monografias de faculdade. O João, nosso cabeção, vai escrever os trabalhos e nós vamos vender camisetas pra nos proteger. Assim, o cara que quiser comprar um trabalho no esquema, vai comprar primeiro uma camiseta pelo preço que for pagar no trabalho, digamos 100 reais, e em retorno enviáramos a ele o trabalho de faculdade, e o sortudo ainda fica com a camiseta. Porque a camiseta? Para poder explicara imensa quantidade de dinheiro que vamos faturar nesse esquema. Assim, ficamos limpo, todo mundo sacou?- o rapaz indagou aos colegas de seu lugar na cabeceira da mesa da sala, minutos antes de seus pais chegarem do trabalho.

Esse João esta começando a encher o saco. Ta sempre querendo mais e mais. E dai se é ele quem esta produzindo os trabalhos. O esquema é de todos nós. Todo mundo tem que ganhar nessa parada. E as camisetas estão vendendo pra caraca. Então se esse cara quer mesmo causar problema, que se dane, tem bastante CDF por ai passando fome que faz os trabalhos pela metade do que estamos dando a ele. Por mim nós afastamos desse babaca.- o moço aconselhou logo antes do grupo decidir por se livrar de João.

Tudo no esquema. Casas em nomes de laranjas, caros em nome da mamãe, a vida realmente é bela. Se todos os esquemas entrarem na data este ano, eu vou ter faturado na casa dos 4 mizão. É isso mesmo meu chapa, você é o cara. Você teve que da duro, claro, e algumas decisões foram obviamente desagradáveis. Mas todas necessárias, sem elas não teria chegado aqui. Prestes hoje a ser recebido pela casa. Finalmente, cheguei em um lugar bom. Vivendo relaxado, agora sim, o céu é o limite! -ele refletiu enquanto encarava seu reflexo no espelho do banheiro de sua cobertura sua mulher ainda dormindo no quarto.

Senhor presidente, eu gostaria de aproveitar esta oportunidade para homenagear a mais recente adição a esta casa. Em nosso colega teremos um exemplo de ética e honestidade. Ele sim será uma adição crucial a esta casa. E gostaria de dizer aqui para todos os senhores Senadores que não só o conheço desde os tempos de faculdade quando começamos nossa primeira empresa juntos, vendendo camisetas, empreendimento humilde que levou grande esforço, mas que também confio nele como um irmão e um grande homem, que lutará conosco pelos princípios que defendemos aqui. Os princípios desta Nação.- os homens anunciaram no dia em que ele tomou posse.

domingo, 1 de junho de 2008

Um tapa na Cara...de quem?

Esta semana diante de um novo temporal de acusações de corrupção obviamente verídicas, fomos comparados ao Chicago de 1930. Concorde ou não, não deixa de ser uma comparação forte. Para quem não conhece a historia se trata do gangsterismo de Al Capone. Um criminal admirável, para quem admira essas coisas. (no rio, aparentemente, todos)

Capone atuou na época da lei seca em Chicago, produzindo e distribuindo bebidas alcoólicas. A maioria de Chicago tinha uma empatia ao gangster, por discordarem da lei, inclusive os policiais que se beneficiavam do arrego e das bebidas. Até ai da pra ver uma semelhança com nossa cidade maravilhosa. Mas a diferença esta na dinâmica do problema.

Capone não fazia parte do governo. E embora seus subornos a vários membros do estado serem de conhecimento publico, quando finalmente foi pego pelo jovem Elliot Ness, perdeu um apelo nos tribunais e cumpriu 11 anos de prisão. Ou seja, quando a policia pegou, o Judiciário funcionou, e o bandido se danou (vou virar poeta). Mas é assim que funciona quando alguém é preso, cabe ao Judiciário apoiar ou reverter a ordem. Claro isso no primeiro mundo.

Na nossa terra porem, temos um sistema digamos um tanto diferente, mesmo assim igualmente fascinante. Aqui, o Legislativo pode libertar um homem! Isso mesmo, o órgão que faz as leis, também, aparentemente, pode julgar como elas estão sendo aplicadas. Esqueça aquela besteira sobre balanço de poderes.

Para quem chegou até aqui sem saber do que se trata, estou falando da decisão risível da Alerj de libertar Álvaro Lins. Álvaro como todo mundo já sabe, incluindo meu padeiro que é analfabeto e cego, é mais culpado que um padre num convento as três da madrugada. Parece, inclusive, que os únicos que não sabem disto são os 40 deputados que votaram na Alerj a favor da libertação.

Mas onde estão os nossos Heróis? Onde está o nosso Elliot Ness para arrastar o Capone até a prisão? E mais importante, onde está o nosso judiciário para garantir que ele fique lá?
Sem fazer apologia, existia lógica em Capone. Por mais infrator que ele era, por mais danoso à sociedade que ele pudesse ser, ele não era eleito, não se sustentava com finanças publicas ou as explorava. Ele não era um protetor da sociedade, era cidadão. E nisso Lins, consegue ser pior, pois abusou da confiança do cidadão.
 

Em realidade o caso só fez provar novamente que não existe coerência em nosso sistema. E os eventos desenrolam de uma maneira que nos deixam perplexos. A comparação é forte sim, e Chicago era um cenário cheio de corrupção e violência nos anos 30. Mas foi nesse mesmo cenário que o sistema quebrou o ladrão. Aqui ao invés, parece que o Ladrão infiltrou o sistema. E por isso me pergunto, com quem é a maior sacanagem da comparação: Nós ou Chicago?

 
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