As aventuras de Dom Antonio
Antônio Lars era um homem altamente compulsivo. Tinha sua rotina sagrada que incluía as atividades da manha, trabalho, jantar em casa entregue sempre pelo mesmo restaurante, e cama as nove em ponto. Seu único amigo era o porteiro Severino com quem falava todo dia por dois minutos. Ao marcar sua viagem o informou imediatamente para garantir que suas plantas seriam aguadas.
- Severino amanha vou viajar para Frankfurt com escala em Sao Paulo e Madrid.-
Com a cara de retardado que só o Severino sabia fazer e sem nenhuma ideia de onde ficava Frankfurt ele disse:
-Tabom Seu Antônio. É só deixar as chave que eu dou agua as plantas-
Na manha da viagem não quebrou nenhum de seus hábitos. Antônio acordou as cinco horas em ponto (em seu apartamento impecável) e ligou a maquina espanhola de café que já continha exatamente 4 gramas de café, enquanto tomava banho. Seu banho de exatamente quarto minutos lhe deixava um minuto para se secar enquanto o café ficava pronto. Saindo do banho numa linha continua ele pegava o café, abria a porta de casa para apanhar o jornal e se sentava em sua varanda. Cruzava a perna direita sobre a esquerda e lia o jornal ate exatamente as oito. Era um homem exato.
Depois de ajeitar tudo com Severino se despediu e saiu para o aeroporto pouco depois do meio dia. Sua viagem demorou pela observação de Antônio quarenta e dois minutos. Ao chegar nem notou a bagunça no aeroporto como tinha se acostumado a fazer para preservar sua sanidade. Com toda a calma e elegância que faltava no ambiente ele em seu terno azul, cabelo colado pra tras e carregando um guarda chuva como uma bengala andou até o balcão e disse simplesmente:
-Eu gostaria de fazer o check-in por favor para o vôo das seis saindo do Rio de Janeiro para Frankfurt com escala em Sao Paulo e Madrid. -
As atendentes do balcão, como o resto do aeroporto que não tiravam seus olhos do Antônio, se entreolharam por um segundo com um sorriso.
-Desculpa senhor mas não começamos a fazer check-in para este vôo ainda. Se o senhor quiser se sentar, devemos começar às quatro. -
O esforco de ficar parado no meio daquelas pessoas mal educadas jogadas pelo chão, foi todo desperdicado pois as quatro as cinco e as cinco e meia a resposta foi a mesma. “Só um pouquinho mais, senhor.” As cinco e quarenta e cinco ele voltou outra vez ja sem a calma e a tranquilidade que sempre carregava nos olhos.
-Madame, por favor, gostaria de fazer o check-in para o vôo das seis para Frankfurt com escala em Sao Paulo e Madrid. São cinco e quarenta e seis pelo seu relógio e vou perder meu vôo das seis. -
- Ninguém te falou não? Tá tudo atrasado. Você não vai perder nada! -
A gota de suor que apareceu na testa de Antônio ao ouvir estas palavras pareceu ser a ultima gota. Ele levantou o guarda chuva e começou a gritar,
-Vocês estão de brincadeira! Não sei como vocês podem fazer isto comigo! Isto é uma desgraça! Deviam estar envergonhados de trabalhar para esta companhia-
A atendente tentou explicar que não tinha nada haver com a companhia, que era devido ao apagão aéreo, mas a voz de Antônio não parou um segundo para ouvir-la. Logo uma platéia formou-se atras dele com seus gritos de protesto. Antônio continuou.
- Eu estou aqui há horas!-
- ?????-
- Vocês são umas idiotas com seus chapeuzinhos falando mais um pouquinho, mais um pouquinho…-
- ?????-
A situação ficou feia. Antônio tinha começado um protesto serio, e as atendentes do balcão não sabiam o que fazer. Não fossem os guardas que tinham se mobilizado para garantir a segurança nos aeroportos, teria dado guerra. Quando começaram a espancar o Antônio viram que o problema era maior que pensavam, pois um perfeccionista é como uma rocha só desiste morto. Antônio perdeu a briga mas a luta que ele fez usando o seu guarda chuva como uma espada contra s guardas foi épica. Quando finalmente arrastaram ele do salão do aeroporto os outros passageiros ouviram sua voz desaparecer…
- Eu tenho que embarcar no avião das seis para Frankfurt com escala em Sao…-
Varias brigas depois o soltaram no aeroporto. Antes de ir embora foi ao balcão da companhia aérea e lhes informou que nunca mais viajaria por aquela companhia.
Pelo menos não quebrou sua rotina. Às cinco horas do dia seguinte estava de pé e continuou como se nada tivesse acontecido. Saindo de casa encontrou o Severino na porta e explicou a situação dizendo:
- Já que não vou a Frankfurt você não precisa dar agua as plantas-
E Severino respondeu
- Porque que você não pega um ônibus, chefe?-
Pedro Widmar
4 comentários:
Pedro,
Parabéns pelo blog!
Dom Antonio é um personagem e tanto.
Aquele abraço,
Arthur
Você sabe caracterizar muito bem os personagens. Sua história daria um ótimo curta-metragem...
Abs,
Maria.
Pedro
Seu texto é excelente, muito criativo. Já havia ouvido em sala, mas lido fica fica melhor. O final é ótimo.
Sds
Fabio
i wonder who took that picture...
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